Hana Khalil, apresentadora e ativista, e Mariana Betioli, obstetriz e fundadora da Inciclo, marca de coletores menstruais, explicam como o tema da saúde íntima ainda gera desinformação entre as mulheres
Nos últimos anos, assuntos relacionados aos direitos das mulheres e empoderamento feminino ganharam espaço nas redes sociais. Porém, a temática da saúde feminina, embora esteja sendo timidamente debatida, ainda é motivo de tabu.
Segundo Hana Khalil, apresentadora de um programa na MTV e influenciadora digital, ainda vai demorar certo tempo para que as mulheres aprendam a se relacionar de forma saudável com seus corpos, especialmente no que se refere à saúde íntima.
“Fomos socializadas, ensinadas e educadas, desde que éramos crianças, para termos vergonha e pudor para falar desses assuntos. Até o nome vagina era evitado”, diz. “Nos disseram que o certo era lavar a vagina desesperadamente, só reforçando o quanto ela seria ‘suja’ e ‘fedida’. Minha mãe me ensinou dessa forma, assim como a minha avó ensinou para ela.”
Por conta dessa desinformação generalizada, passada de geração para geração, a própria Hana admite ter sofrido alguns problemas de saúde. “Eu achava que, quanto mais eu lavasse, mais iria ficar saudável. Conheço gente que, inclusive, chegou a utilizar desodorante para limpar a região íntima. Ao longo dos anos, procurei ginecologistas e também fui educada de maneira errônea por vários deles”, lamenta.
A apresentadora, que ganhou fama após participar do BBB 19, é vista como referência na internet no que diz respeito à causa feminista. Para ela, existe uma grande diferença entre a higiene real que a vagina demanda e a forma que a sociedade de consumo nos indica que é a correta.
“Basta irmos à farmácia e observarmos as prateleiras, repletas de produtos com aromas doces e florais para a região íntima. As marcas se aproveitam da relação problemática que temos com a vagina para nos oferecer opções que não fazem bem ao nosso corpo”, explica.
“Até hoje, em menor grau, a imagem da vagina ainda causa uma espécie de nojo nas pessoas e seu odor é constantemente associado ao cheiro de peixe. Para mim, isso indica certo grau de misoginia.”
A ativista também destaca um paradoxo: embora o mercado da higiene íntima foque nas mulheres como público-alvo, são os homens os que mais sofrem com a falta de orientação. No Brasil, cerca de 1.600 pênis são amputados todos os anos, basicamente por não serem lavados da forma ideal. Esses hábitos inadequados de higiene podem levar ao surgimento de doenças diversas, como o câncer.
“Pela lógica, o pênis é um membro muito mais exposto do que a vagina, por exemplo. Então, a higiene é ainda mais primordial. Mesmo assim, aprendemos que a vagina é anti-higiênica por si só, nos fazendo perder o senso do que é saudável e do que não é”, acrescenta.
Como realizar uma higiene íntima adequada
De acordo com Mariana Betioli, obstetriz e fundadora da marca de coletores menstruais Inciclo, a ideia de que a vagina é nojenta e precisa ter seu odor disfarçado deve ser combatida. Ela concorda com Hana e acredita que esse tipo de consenso não é baseado em estudos científicos – e sim em hábitos culturais.
“É muito importante conhecer o seu próprio corpo e seus odores naturais, até para identificar padrões e perceber quando algo não vai bem. É preciso desconstruir esse tabu para a própria segurança das mulheres”, aponta.
Algo fundamental para ajudar na saúde íntima é limpar a região do jeito certo. Só que há um porém: a limpeza não deve ser feita na parte interna, a vagina. A pessoa precisa lavar somente a vulva, que é a área externa.
“A vagina é autolimpante, então pode esquecer ducha, sabonete ou qualquer outro tipo de limpeza interna. Já a vulva, só com água e os dedos, a pessoa consegue higienizar aqueles espaços entre os lábios internos e externos, para tirar uma eventual secreção”, recomenda.
“Se quiser, dá para usar um pouquinho de sabonete neutro na vulva e na parte do monte de vênus, onde nascem os pêlos. Após a limpeza, é só secar direitinho”, acrescenta Mariana.
A especialista também reuniu outras dicas que podem ser valiosas para a saúde da mulher.
1 – Ventilação em primeiro lugar
“A melhor alternativa é usar roupas que deixem a região genital mais ventilada”, indica. “Evite calças jeans e outras peças mais justas e apertadas para dar preferência a saias, vestidos e shorts mais folgados, além do uso de calcinhas de algodão, para ajudar na transpiração da vagina”.
O ideal, inclusive, é dormir sem roupa íntima para deixar a vulva “respirar”, de acordo com a especialista. “A dica é deixar que a região íntima ‘respire’ livremente em pelo menos alguns momentos do dia.”
2 – Não deixe a calcinha secar no banheiro
Para quem costuma deixar as peças íntimas secando no banheiro, muita atenção. “Não tem nada de errado em lavar a calcinha no banho usando um sabonete neutro. O problema é deixar a calcinha secando no box”, diz.
“O banheiro é uma região úmida; lá, sua calcinha vai demorar mais para secar e ter mais chance de atrair fungos e bactérias. Se você lava suas peças íntimas no banho, coloque suas calcinhas para secar no varal, que é um ambiente seco e arejado.”
3 – Sexo com camisinha
Não pense que a camisinha durante a relação sexual evita apenas uma gravidez indesejada. “A proteção no momento do sexo também diminui as chances de contrair infecções sexualmente transmissíveis (IST)”, ressalta a obstetriz. “Não deixe de se consultar com uma ginecologista de confiança, fazer exames regulares e acompanhar de perto a sua saúde íntima.”
4 – Cuidado extra durante a menstruação
Além disso, segundo Mariana, o coletor e o disco menstrual, o absorvente de pano e a calcinha absorvente são opções mais saudáveis para a região íntima.
“Os modelos mais comuns do mercado – os absorventes descartáveis externo e interno – não são os mais indicados. O absorvente externo abafa essa região e o sangue que fica em contato com a vulva começa a entrar em decomposição, o que também aumenta o risco de problemas”, afirma.
“Já os absorventes internos, quando inseridos no canal vaginal, acabam sugando não só o sangue, mas também toda a umidade da vagina, desregulando o pH e favorecendo a proliferação de fungos e bactérias indesejadas.”
Para ela, o ideal é evitar produtos químicos em contato com a região genital. “O coletor e o disco menstrual da Inciclo são feitos de silicone hipoalergênico, um material livre de substâncias químicas. Da mesma forma, as nossas calcinhas absorventes são feitas com tecido respirável com tratamento antimicrobiano, livre de camadas plásticas, que permite manter a vulva arejada”, garante a especialista.